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A partilha do Marrocos, uma terra incógnita

junho 14, 2010

por Douglas Armendone

Na corrida europeia por possessões coloniais no continente africano, o Marrocos era de importância política, estratégica e econômica. Última parte da África a ser dividida, o país esteve sob um longo processo de influências europeias antes de, efetivamente, tornar-se um protetorado.

Um dos aspectos relevantes na análise sobre a ocupação do território marroquino é a rivalidade entre França e Alemanha. No período em questão, a divergência padrão costumava ser entre britânicos e franceses.  No Marrocos, houve uma inversão de velhos antagonismos.

O Marrocos foi o primeiro capítulo na história dos fatos que culminaram na Primeira Guerra Mundial. É uma parte da história europeia, não da colonial. Dois fatores principais da partilha tardia do Marrocos foram a situação interna do país e o estado das relações internacionais.

O país é naturalmente isolado, uma ilha por assim dizer. No entanto, o Marrocos é a parte da África mais próxima da Europa. A distância entre os dois continentes é inferior a 15 quilômetros no ponto mais apertado do estreito de Gibraltar. Apesar da proximidade, mesmo no século XIX, o país ainda era desconhecido e inacessível. Os relatórios dos poucos viajantes europeus que por ele se aventuravam sublinhavam características como caos, ilegalidade e anarquia para caracterizá-lo.

O Marrocos isolava-se do mundo externo como podia. Tratava-se de uma terra incógnita. Algo que impressionava os visitantes europeus era a má administração do país. O governo era uma máquina de arrecadar dinheiro, a opinião geral dos visitantes estava baseada sobre quão típicos costumavam ser os abusos, a desordem, sublevações, guerras civis e anarquia. Muitos escritores o comparavam com países atrasados como China, Afeganistão e a Pérsia.

Outro ponto importante que poderia confirmar a tentativa deliberada dos governantes marroquinos de se afastar do ocidente era o fato de país não possuir estradas que pudessem ser consideradas como tais. Viajar pelo Marrocos era tarefa cansativa e perigosa, o país pretendia manter-se alheio ao Ocidente e deste modo das forças do progresso e da renovação.

Segundo o autor, parece ter sido exatamente essa política que ajudou a preservar a independência marroquina durante o maior tempo possível. Na Tunísia e no Egito foi adotada apaixonadamente a causa do progresso e do desenvolvimento. O que se seguiu foi a mesma história de dívidas, empréstimos, novas dívidas, novos empréstimos, tutela financeira e finalmente a perda da independência. Os governantes do Marrocos rejeitaram essa opção plena de perigos financeiros. A força do Marrocos estava no seu atraso.

Em 1830, a França estabeleceu seu governo na Argélia e tornou-se vizinha imediata do Marrocos. As fronteiras pouco definidas entre os dois lados permitiram que os franceses tirassem proveito das oportunidades de penetrar em território marroquino. A partir de então, o Marrocos começou a envolver-se nas lutas colonialistas contra as potências europeias.

A economia agrária, natural e fechada, não era o que atraía os europeus. Com o crescimento do comércio mundial, os produtos da pauta de exportação marroquina podiam ser encontrados em diversas outras partes do mundo, tal como Austrália, Índia e América. Em termos comerciais o Marrocos era insignificante. Todavia, sua estratégica localização geográfica era, e é, de enorme importância. Espanha e Grã-Bretanha, os outros dois países que controlavam essa entrada, não estavam alheios ao fato. No mesmo ritmo e motivados por interesses semelhantes, França e Itália desejavam participar do que era decidido na região.

A chamada “penetração pacífica” no Marrocos aconteceu entre os anos de 1856 até 1863, o prelúdio a um período de crescente incursão europeia. A influência europeia expandia-se à medida que a independência marroquina diminuía.

Não foram poucos os marroquinos sobre ‘proteção’ europeia. Vários milhares de marroquinos ao todo fugiam da jurisdição (e dos impostos) do sultão. Naturalmente, o setor mais afluente foi que mais tirou vantagens dessa brecha legal.

A Conferência de Madri, de maio a julho de 1880, significou o fim da independência marroquina. O sultão, motivado por extinguir ou reduzir o sistema de proteção europeu, acabou por alcançar resultado oposto, ou seja, o reconhecimento oficial do sistema de proteção.

Em 1859, uma disputa com a Espanha pelas fronteiras do enclave de Ceuta provocou uma guerra que durou até 1860.  As forças marroquinas saíram derrotadas. O sultanato teve que pagar uma pesada indenização, pagada com empréstimos externos, além de ceder à Espanha o encrave de Ifni.

O sultanato promoveu uma série de reformas para evitar o avanço da penetração europeia. Reorganizou a administração, fortaleceu o Exército e comprou artilharia e rifles no exterior. Contudo, as reformas malograram devido sobretudo à ausência de um aparato governamental  adequado e à resistência da elite tradicional. A inflação disparou e as tentativas de reforma monetária não foram suficientes. As opções eram gastar menos ou fazer mais empréstimos. Isso não ocorreu sob Mulay Hassan, mas sob seu filho Mulay Abdelaziz. O sucessor contava apenas quatorze anos quando ascendeu ao trono.

Sob seu governo o declínio transformou-se em crise. Abdelaziz acumulou dívidas e para pagá-las teve de arrendar a estrangeiros suas rendas alfandegárias, monopólios estatais e outros proventos. Mulay Hafid, seu irmão e também vice-rei no sul, ganhou apoio generalizado quando foi proclamado sultão rival em Marrakech no ano de 1907. Daí em diante, o Marrocos passou a ter dois soberanos e a dissolução do Estado foi total. A Europa entrou.

Tinham interesse especial no Marrocos: Espanha, França, Itália, Alemanha e Grã-Bretanha. Os franceses e espanhóis desejavam sair com parte do território marroquino, por sua vez, os demais buscavam alguma forma de compensação da qual se julgavam merecedores.

A Espanha achava que tinha reivindicação moral e histórica, seja por sua proximidade geográfica e pelo envolvimento comercial geral e marítimo com os marroquinos. Dos residentes europeus no Marrocos, os espanhóis eram grande maioria. As potências reconheceram o direito moral da Espanha a opinar nos negócios marroquinos, além de assegurar uma fatia numa eventual partilha. Pode-se deduzir isso do fato de as duas grandes conferências sobre o Marrocos terem tido como sede a cidade de Madri, em 1880, e Algeciras em 1906.

Para a Itália, o interesse no Marrocos estava relacionado a outro país. Em troca de aceitar sua intervenção na Líbia, a Itália estaria de acordo com o avanço francês no Marrocos.

O acordo anglo-francês esteve baseado em apostas maiores. A Grã-Bretanha era a potência colonial e marítima mais importante do mundo. Possuía ainda os maiores interesses econômicos no Marrocos, embora fossem quase exclusivamente de natureza comercial. Mais importantes que os fatores econômicos, era o peso estratégico marroquino em razão do estreito de Gibraltar.

Os interesses franceses no Marrocos eram basicamente comerciais e financeiros, mas sobretudo estratégicos. Tal como os ingleses, inicialmente preferiram adotar uma política de status quo, ou seja, uma política de esperar e ver. Depois, a anexação do Marrocos tornou-se objetivo político declarado. As mudanças na definição da política marroquina por parte das potências europeias baseavam-se em considerações geopolíticas e estratégicas e não da reavaliação da importância do próprio Marrocos.

Outrossim, vale ressaltar que o incidente de Fashoda foi ponto decisivo na política colonial francesa. A clara demonstração da determinação e capacidade da Grã-Bretanha de permanecer no Egito ajudara a produzir uma mudança de opinião entre os mais realistas colonialistas franceses, o confronto deu lugar a uma política de compensação. O Marrocos foi o novo preço pedido pela França para liquidar o valor de seu prejuízo no Egito.

Durante a Guerra Bôer, a França tentou conquistar o apoio da Alemanha para uma intervenção conjunta no Marrocos. Sem êxito, a conclusão foi que os alemães eram os principais rivais dos franceses, mesmo no campo colonial.

Foi a crise interna no Marrocos que tornou insustentável a preservação do status quo, antigo objetivo comum da política marroquina da França e da Grã-Bretanha. Um protetorado europeu parecia inevitável.

A Alemanha começara a interessar-se pelo Marrocos sob Bismarck, principalmente por motivos diplomáticos, já que para ele o Marrocos era um meio de dificultar a vida para a França. Qual era exatamente o objetivo da Alemanha? A diplomacia germânica estava confusa e faltava-lhe comando. Em suma, a Alemanha não sabia o que queria, mas sabia que queria alguma coisa.

A questão marroquina, portanto, assumiu uma importância que transcendia de longe a preocupação com o próprio Marrocos. As crises marroquinas eram os únicos fatos em toda a partilha da África a ameaçar a paz mundial. Uma guerra entre França e Alemanha se transformaria numa guerra europeia, inevitavelmente. Os vários aliados dessas potências seriam arrastados em virtude de pactos e alianças. Por isso é que o Marrocos desempenhou um papel tão especial na partilha da África.

Na Conferência de Algeciras, de janeiro a abril de 1906, duas questões importantes deveriam ser discutidas: o estabelecimento de um banco central internacional no Marrocos e a organização da polícia nos principais portos.

O resultado mais importante de Algeciras foi o isolamento da Alemanha. A França emergiu fortalecida do confronto, tanto em termos de influência real sobre o Marrocos quanto em sua posição diplomática. É verdade que a solução do Marrocos continuou sem solução, e os alemães ainda se encontravam em posição de provocar problemas suficientes para dificultar a vida para os franceses.

Enquanto isso, o Tratado de Algeciras proporcionou à França apoio estrangeiro suficiente para uma política de intervenção militar. A França e a Espanha combinaram, então, uma ação militar conjunta. O resultado foi o maior envolvimento francês e espanhol no Marrocos.

Em abril do ano de 1911, Mulay Hafid pediu ajuda militar francesa. A ajuda veio na forma de uma expedição militar e assinalou o início da segunda e última grande crise marroquina.

Os espanhóis reagiram imediatamente. Por seu turno, os alemães, enviaram a canhoneira Panther ao Marrocos, onde ancorou na costa de Agadir em julho de 1911.

Assim como outras potências, a Alemanha queria compensação. O fato de enviar uma canhoneira em vez de tropas significava que não estava seriamente decidida a invadir o país. Queria intimidar, não ocupar. No fim das contas, a Alemanha assinou com a França um acordo em que o Congo francês passaria ao poder dos alemães.

O Tratado de Fez, assinado em março de 1912, abriu o caminho para a partilha do Marrocos. Estipulou também que França e Espanha acertariam os detalhes. Na teoria, esse tratado estabeleceu um tipo de governo duplo no Marrocos. O sultão preservava sua prerrogativa de soberania, mas entregava o controle da justiça, defesa, relações exteriores e finanças. Na prática, o sistema de governo duplo acabou se tornando um sistema de governo direto da França. O Estado marroquino sobrevivia apenas na forma. No conteúdo, tornou-se francês.

A real sujeição do Marrocos não ocorreu. Logo depois que vieram a público os termos do tratado, as tropas e habitantes de Fez sublevaram-se e assassinaram todo europeu que puderam encontrar. O protetorado teve, portanto, de ser estabelecido pela força e isso acabou sendo uma tarefa longa e dispendiosa.

A conquista de todo o Marrocos só terminou em 1934, 22 anos depois da assinatura do Tratado de Fez. Em 1956, passados outros 22 anos, o Marrocos reconquistou sua independência.

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Sobre as Conferências de Potsdam, Ialta e São Francisco

novembro 25, 2008

Nas Conferências de Cúpula de Yalta e Potsdam, os vencedores da guerra remontaram o mapa geopolítico europeu. As conferências refletiram o antagonismo entre EUA e a URSS no momento imediatamente anterior à deflagração da Guerra Fria.
the Allies shaking hands
A Conferência de Yalta reuniu os Três Grandes (EUA, URSS e Grã-Bretanha), representados por Franklin Roosevelt, Josef Stalin e Winston Churchill. As principais decisões de Yalta referiram-se às fronteiras soviéticas e ao destino dos países do Leste Europeu, entre eles os países do Eixo (Itália, Japão e Alemanha) que perderam a guerra. Na Conferência, a União Soviética conseguiu recuperar praticamente todos os territórios perdidos durante a IWW, pela anexação dos Estados Bálticos (Letônia, Lituânia e Estônia) e da Polônia (Bielorrússia). Yalta foi a conferência da conciliação dos vencedores, e sua declaração final, expressão do festejado “espírito de Yalta” (entendimento), aparentemente abria uma longa era de paz e estabilidade na Europa.

A Conferência de Potsdam realizou-se numa correlação de forças diferente da de Yalta. Pouco antes da abertura da Cúpula, os americanos testaram a bomba atômica no Deserto do Novo México e usariam-na em 6 de agosto de 1945 (Hiroshima) e em 9 de agosto (Nagasaki). A posse dessa arma colocava os americanos em melhores condições de negociação. O tema principal da discussão era o futuro do território alemão. Em um clima hostil e competitivo decidiram pela divisão da Alemanha em zonas de ocupação (EUA, França, Grã-Bretanha e URSS) e foi adiada a discussão sobre a unificação alemã, proclamada como meta pelos participantes.

A Conferência de São Francisco foi realizada com objetivo de substituir a velha Liga das Nações por uma nova organização internacional. É criada a ONU com o objetivo de preservar a paz e a segurança coletiva e promover a cooperação internacional para a resolução de problemas econômicos, sociais, culturais e humanitários.

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O fracasso da Liga das Nações, algumas razões

outubro 10, 2008

por Douglas Armendone

No fim da I Guerra Mundial, o Tratado de Versalhes (1919) foi assinado pelas potencias européias e encerrou oficialmente a guerra; foi criada a Liga das Nações (1919) com os EUA desejando administrar o mundo, a Liga pretendia arbitrar disputas internacionais e por intermédio disso evitar futuras guerras. Devido ao posicionamento dos países sobre o que deveria ser a Liga e como ela deveria agir, ela acabou falida em 1946 apesar de lutar para impor sua autoridade como instituição internacional importante.

Embora a Liga se mostrasse, assim, como uma organização capaz de resolver litígios entre potências menos importantes e de promover um grande leque de atividades humanitárias e econômicas, ela não era capaz de lidar com atos agressivos de seus membros mais importantes. E, lembrar de seus sucessos iniciais – prevenção dos conflitos nos Bálcãs, ajuda à reconstrução da economia austríaca, fundamentos de uma verdadeira política de desarmamento…-, seria esquecer a impotência da Liga das Nações por ocasião da agressão japonesa à China (Manchúria), em 1931; durante a invasão e anexação da Abissínia (Etiópia) por Mussolini (Itália) em 1935; sem mencionar o rompimento da Alemanha com o início do governo nazista (Hitler – 1933); e o fracasso em matéria de desarmamento.

Em 1939, com a declaração de guerra, a Liga decidiu interromper suas sessões até a paz. Depois de 1939, a Liga das Nações esvaziou-se e restringiu-se a atividades técnicas como a proteção de refugiados e os estudos sobre a futura reconstrução.

Os líderes não ignoraram que muitas vezes os faltou coragem moral, que muitas vezes hesitaram quando era preciso agir, que às vezes agiram quando era preciso e seria mais sensato hesitar. E, alguns dizem que os governos não souberam colocar-se acima de seus interesses particulares.

Esvaziada no fim da II WW, a Liga é substituída pela ONU, que logo seria vista manifestando a mesma impotência em relação a questões de desarmamento.

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