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A validade da abordagem pós-estruturalista de Shapiro

setembro 5, 2008

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SHAPIRO e a ABORDAGEM PÓS-ESTRUTUALISTA

  • Há coerência em afirmar que a política global deve ser tratada como um texto?
  • Tentarei relacionar a construção de Estados Nacionais à produção cinematográfica. Além de ilustrar o argumento com exemplos a fim de ressaltar a validade da abordagem pós-estruturalista de Shapiro.

 Sim, há coerência em afirmar que a política global deve ser tratada como um texto. Podemos apreciar a relação intima entre práticas textuais e política quando damos reconhecimento adequado aos textos em que o mundo emerge e provido um entendimento da política que foca nessas imposições de significado e valor. São as práticas textuais dominantes e sobreviventes que originam os sistemas de significado e valor dos quais as ações e políticas são dirigidas e legitimadas.

Se um dado aspecto da realidade social é uma questão de contenção ou é tido como natural e não-problemático, o significado é sempre imposto, não descoberto, uma vez que o mundo familiar não pode ser separado das práticas interpretativas através das quais ele é feito.

Por exemplo, se referir à “América Latina” não significa somente se referir a uma área no globo, é ajudar a reproduzir uma forma institucionalizada de dominação, na qual a minoria, parte Hispânica da população na região controla os grupos indígenas originais. Até mesmo o uso do nome de uma nação reconhecida é um gesto político (o autor cita a Guatemala), onde o indivíduo se deixa conduzir pelo modo de representação geopolítico prevalecente.

Textualizar um âmbito de análise é reconhecer que qualquer “realidade” é mediada por um modo de representação e; que as representações não são descrições de um mundo de faticidade (‘facticity’), mas são modos de fazer faticidade. Os modos de análise textualista ou pós-estruturalista enfatizam o “discurso” ao invés da linguagem. O conceito de discurso implica numa relação com práticas produtoras de significado e valor na linguagem ao invés de estritamente a relação entre formas de expressão e seus referentes.

Entender o mundo como mediado por práticas textuais significa encorajar modos de questionamento e inquirição que não são familiares dentro de caminhos mais tradicionais (empírico e interpretativo). Shapiro afirma que a própria análise é uma prática textual.

O Cinema, por exemplo, funciona como “Diplomacia de Hollywood”. Cinema é muito mais do que contar estórias. Em muitas produções norte-americanas, os vilões são latino-americanos traficantes, árabes terroristas e asiáticos tiranos. Bom exemplo é o conjunto dos filmes do agente 007, recordistas de bilheteria. Essa “leitura dupla” (ou alternativa) das produções cinematográficas não é exclusividade dos pós-modernos. Hans Morgenthau sustenta em uma de suas premissas do Realismo que a política é autônoma de outras esferas e que nada é mais importante do que a política, sendo ela o único fim; Maquiavel em “O Príncipe” fala da amoralidade da política. O que se observa é que o Cinema está se valendo dessas premissas. Em tempos onde a censura faz a censura de seu próprio poder, tudo vale em prol da arte. Os fins justificam os meios! Cinema e artes são amorais, mas como toda ação gera uma reação é importante estabelecer controles. O mesmo Morgenthau afirmou que na luta pelo poder, além da Política de Imperialismo e Status Quo, a Política de Prestígio tornou-se uma arma política particularmente importante em um período em que a luta pelo poder é travada não somente mediante o recurso de métodos tradicionais de pressão política e força militar, mas também, em larga medida, como um combate pela conquista das mentes dos homens (manipulando avaliações). O grupo acredita que esses argumentos ditos realistas têm características da “corrente” pós-moderna, pois como eles próprios afirmam, a leitura (interpretação) realista de Clássicos como Tucídides, Maquiavel e Hobbes é uma tentativa de estabelecer uma linhagem intelectual que dê credibilidade aos pressupostos realistas.

Os pós-modernos desconfiam de todas as tentativas de classificação, de todas as categorizações e de todos os esforços para encontrar verdades universais; um empreendimento que consideram incompatível com a alteridade, a abertura, a pluralidade, a diversidade e a diferença em todas as dimensões da vida social. Através da difusão dos chamados valores universais e o apoio da mídia, tem crescido ainda mais a utilização da indústria cultural como instrumento da grande diplomacia. Este fenômeno é extremamente preocupante, seja para a cultura Ocidental, para as relações internacionais, ou para os povos visados por este tipo de produção e pelos interesses político-econômicos que lhe dão suporte, e de modo claro, as influências e determinismos na construção de Estados Nacionais.

A mobilização constante da política externa como prática de produção de perigo e diferença assume lugar central na reprodução do Estado como o local da realização da identidade política e de legitimação da exclusão de subjetividades alternativas que não se ajustem ao regime dominante de poder/conhecimento (Foucault).

Sabe-se que toda verdade é afirmação de uma posição de poder e reflete estruturas de dominação que pretendem, por meio do discurso cientifico, apresentar-se como neutros e naturais. Por isso, a desconstrução trabalha com o intuito de questionar as dicotomias (anarquia/soberania; guerra/paz; cidadão/estrangeiro; identidade/diferença; idéias/interesses; etc) nas quais as teorias dominantes se baseiam para construir sua representação da política global.

Paulo Vizentini, em artigo no site Terra, fala de como é surpreendente como em plena era da informática, milhões de pessoas se deixam levar por uma construção virtual que encobre a realidade, sentindo-se particularmente atraídas pelo idealizado e exótico. E que na luta enérgica contra o terrorismo tem-se esquecido, porém, de lutar contra o terrorismo intelectual. Esse, supracitado, que quase imperceptivelmente adentra as mentes humanas é tão perigoso quanto todas as formas mais alardeadas.

Os desenhos animados também devem ser notados como fonte diplomática e idealizadora. Sobretudo, se relacionam com crianças – matérias-primas -, olhos atentos e absorvedores de conteúdo. Há os acreditam em mensagens subliminares. È comum, os heróis dos cartoons norte-americanos, orgulhosos de pertencer à sua pátria, constantemente se verem envolvidos pela bandeira dos EUA. Os heróis são sempre o cidadão-típico americano, de Batman a Superman, com superpoderes ou ferramentas inusitadas, todos vivem uma espécie de “sonho americano”, com residência fixa em algum estado do dito país. Há uma batalha de audiência e preferência entre esses heróis conhecidos e os ineditismos trazidos pelos asiáticos. Na programação televisiva é corriqueiro se deparar com produções do gênero vindas do Leste Asiático, os mangás fazem sucesso num amplo leque de idades; e independente da ‘falta de receptividade’ estadunidense têm tido muita notoriedade. Lembramos de Arrighi, seus ciclos hegemônicos e sua sutil referência à possibilidade de uma nova potência hegemônica se originar no Leste Asiático…

Ainda no tema de desenhos animados: O Brasil durante o governo Getúlio Vargas (1930-1945), tinha um projeto político que consistia na industrialização política e militar do país. O duplo jogo de Vargas, mantido face ao imperialismo norte-americano e alemão era a decorrência desse projeto. Getulio muito matreiro, conhecendo a germanofobia americana, dissimulou uma aproximação com o 3º Reich. Logo os americanos começaram a negociar com o governo. Fizeram várias concessões para que o Brasil pudesse fechar um acordo pró-aliado. Em todos os sentidos os Estados Unidos buscaram uma integração com o povo brasileiro. Do cinema ao rádio. Em 1941, Walt Disney iniciou uma peregrinação pela América Latina, como parte da política de boa vizinhança adotada pelo governo dos Estados Unidos desde o início dos anos 1930. A viagem também carregava o claro objetivo de angariar a simpatia dos países candidatos a integrar o grupo dos Aliados na Segunda Guerra Mundial. Foi desse caldo de interesses político-militares que surgiram personagens como Zé Carioca (Brasil) e Panchito (México). Walt Disney criou o Zé Carioca como uma maneira de integrar a ave símbolo do Brasil com o famoso Pato Donald americano. Carmem Miranda (portuguesa de nascimento) com o seu “o quê que a baiana tem” passou a ser a namoradinha da América. Esses entre outros recursos foram utilizados pelos americanos para seduzir a opinião publica brasileira. Fechado o acordo, o governo brasileiro cedeu aos americanos o terreno para a construção da base militar americana de Natal no RN. Mesmo enquanto usavam essa galeria de personagens a favor de suas tropas ou contra os Aliados, os países do Eixo proibiram a circulação de quadrinhos Disney em seus territórios. A exceção coube à Itália, por um motivo tão simples quanto irônico: o ditador fascista Benito Mussolini era fã declarado dos personagens de Walt Disney.

O que a análise pós-estruturalista aponta é que a ortodoxia de nossos mundos, social e político, é recriada no processo de escrita, no estilo dos textos através dos quais nossas compreensões dominantes do mundo têm sido construídas.

Shapiro conclui com a elucidação valiosa de que uma prática textual politicizadora é, portanto, não meramente uma questão de introduzir um vocabulário epistemológico alternativo, mas está intimamente conectada com uma oposição radical aos moldes de significado que destextualiza e, por meio disso, remove formas de poder e autoridade.

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